Estive,
na semana passada, em um estúdio de impressão, cópias e reprodução de
documentos (as chamadas kônicas, em Luanda) e presenciei algo que me deixou
pasmado. Na verdade não era a primeira vez que tinha presenciado algo do
género, mas pelo fato dessa última vez me ter chamado a atenção de tal maneira,
resolvi escrever sobre o assunto.
Não
são poucas as vezes que vou a estúdios copiar ou imprimir algum documento, e em
muitos deles há reclames, em lugares claramente visíveis, com os dizeres, em
letras garrafais: “AQUI NÃO SE FALSIFICA DOCUMENTOS” — ou similares. Mas esse
ato de tamanha injustiça, mesclado de algum engenho humano que muito me
impressionou, e entristeceu muito mais, é exatamente o oposto do que esses
reclames dizem. Pelo que pude ver, o grupo de jovens trabalhadores daquela pequena
empresa estava a usar um famoso programa de edição de imagem para alterar dados
de um certificado de habilitação que me pareceu ser da 9ª ou da 12ª classe.
Semanas
antes e em um outro estúdio, vi com meus olhos (pleonasmo propositado) um trabalhador,
também jovem, a adulterar dados de uma declaração de serviço para sabe-se lá
que fim. Mas devo dizer que coisas do tipo não são restritas somente a jovens,
pois, além dos muitos alunos que se dirigiram a mim, no colégio onde trabalhei
até o ano transato, com o fim de negociar — e muitos até implorando! — uma
declaração ou certificado falso, recebi de um colega professor, e portanto
adulto, pedidos insistentes para emitir uma declaração de estudos falsa em nome
de um familiar seu que precisava para certa oportunidade de emprego.
São
muitos os motivos, imagino, por que muitos vêm aderindo a essa prática
condenável e que aos poucos vai ganhando espaço em muitas áreas da nossa
sociedade. Pergunto-me quais serão as consequências que advirão disso se não a
combatermos agora. Pergunto-me se esse mal tem sido praticado unicamente em
pequenas e médias empresas e que os serviços públicos estão isentos dele. São
muitas as questões que me vêm à mente quando me ponho a cogitar sobre isso: por
que razões muitos aderem? São várias as razões, já disse. Mas, porquê muitos
consentem, participando do mesmo? Dinheiro. Ganância. Queremos sempre mais. E
mais. E mais.
Como
se diz na gíria, o mundo anda de patas para o ar e todos nós sabemos. Mas se
deixarmos a caravana seguir do jeito que está seguindo, sem fazermos, cada um
de nós, alguma coisa contra, acabaremos tendo uma sociedade facilitada, onde
ninguém precisará estudar e/ou trabalhar arduamente, e de maneira justa, para
conseguir atingir os patamares que almeja, pois teremos à nossa disposição as
kônicas, os colegas e os amigos, que nos concederiam o que precisarmos em
recompensa de alguns trocados. E uma sociedade onde reina a injustiça!
Tenho
os meus princípios. Quase todos têm seus. E não raras vezes somos tentados a
violá-los por alguma razão ou interesse, às vezes alheio aos nossos. O
desconhecido que nos procura com uma proposta tentadora, o colega que quer uma
‘ajudinha’, ainda que seja injusta, o chefe que ordena que se faça algum
trabalho desonesto, a sociedade que nos impulsiona a querer mais… o mundo seria
uma maravilha se fôssemos audazes e disséssemos “Não!” sempre educados, diante
de situações do género, mesmo que isso nos custe alguma recompensa e quando
muito, explicássemos o mal que esses atos fazem a todos...
Luanda,
Fevereiro de 2016